QUEM REALMENTE SOU

Minha foto
BUÍQUE, NORDESTE/PERNAMBUCO, Brazil
A VERDADE SEMPRE FOI UMA CONSTANTE EM MINHA VIDA.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

FESTAS DE RUA, CRÔNICA PARA SER LIDA.

           
            Quando era moleque pequeno, de calças curtas, gostava muito de vir à rua nos dias de festa para olhar o movimento. Menino pobre, sapato de sola, furado, roupinha de tecido chinfrim, mas bem cuidada por minha mãe, que era uma exímia engomadeira de roupa, lá ia eu, cabisbaixo, taciturno, tímido como os diabos, olhar as matutinhas a andar em grupo pelas ruas nas festas de São Félix de Cantalice, o padroeiro de Buíque; nas festas de São Sebastião, na praça do mesmo nome; nas festas de São João e São Pedro e, me deliciava com todas essas festanças. Pelo fato de ter nascido no Sítio Cigano, era um matuto danado. Não costumava falar muito, principalmente, quando estava diante de gente muito importante, como os grã-finos da cidade, àquelas pessoas bem vestidas com vestimentas de linho ou cáqui bem alinhadas. Nem perto delas chegava. Ficava somente de longe a observá-las. A timidez era minha maior inimiga. Acho que na minha infância, o meu maior amigo era o meu cachorro que eu dei o nome de japonês. Não sei por qual razão, pois naquela época eu sequer tinha uma idéia de como seria a aparência física de um japonês, mas mesmo assim coloquei o nome do meu cachorro de japonês. Uma das características de japonês, era a de que quando a gente pegava no rabo dele e dava uma puxada, não sei bem por qual motivo, ele ficava rodopiando atrás de pegar seu próprio rabo. Eu gostava de ver aquilo e danava a puxar o rabo de japonês. Tive uma pena dos diabos quando eu e minha família, como que retirantes, fomos embora para São Paulo e tivemos que nos desfazer de uma série de coisas e objetos, apesar de termos levado um amontoado de bugigangas arrumadas em sacos e, tive também que vender o meu cachorro japonês. Lembro bem que o vendi por cerca de dois mil réis, sei lá, se era mesma essa moeda, só sei que foi por dois mil qualquer coisa, a uma pessoa de Santa Clara (Tupanatinga). Japonês foi colocado em cima de um caminhão e, como que me dizendo adeus foi balançando o rabo. Sei que chorei com saudades do meu cachorro, o meu amigo, mas não tinha como levá-lo para São Paulo.
              Pois voltando ao assunto festas, gostava principalmente das festas de fim de ano em Buíque, onde as ruas ficaram empaturradas de gente. Era gente por todos os lados das ruas, que também ficavam cheias de barracas e mais barracas, e amontoados de abacaxi para a matutada tirar a ressaca depois de uma noite de muita cachaça e vinho jurubeba indiano. Era bêbado por todos os lados e raro, era uma festa de fim de ano em Buíque que não tivesse confusão, brigas, furadas com facas peixeira e até mortes, às vezes. Nessas festas gostava somente de andar pelas ruas e olhar as pessoas. Por ser um menino ainda com somente os meus dez a doze anos de idade, minha mãe não permitia que eu namorasse, pois era pecado menino nessa idade namorar naquele tempo. Lembro até que na escola municipal em que aprendi as minhas primeiras letras, em Buíque, onde Dona Aderia Cursino era minha professora, somente pelo fato de uns colegas de classe insinuarem que eu estava namorando uma menina, a rigorosa professora me deu uns puxões de orelhas e umas palmatórias nas mãos, que quando lembro ainda me dói. Mas era assim mesmo, menino naquela idade namorar, nem pensar! - Namoro era somente para gente adulta, assim mesmo, não podia nem sequer pegar na mão. Beijar, pegar na mão ou namorar na escada da igreja, era um escândalo danado e a moça ficava até falada e só se ouvia os comentários quando alguém ia além dos costumes da época. Você viu, fulano, a filha de sicrano se beijando com beltrano no escurinho das calçadas da igreja? - Que despudor, que vergonha! - Quem diabos agora vai querer casar com uma moça dessas, falada! - Quem assim age, só pode ser uma quenga safada, uma rapariga das mais baratas. Acho que os fantasmas dessas pessoas daquela época, que certamente devem rondar a cidade, devem ficar pasmos, de cabelos em pé com os namoros ou trepanças de hoje em dia. Hoje não mais se namora, se convida logo para um motel e com o cuidado de usar uma camisinha resistente para não contrair AIDS, que é o mal maior deste século.
            Falar num determinado assunto, geralmente atrai outros. Outras festas que tanto gostava de olhar, só olhava mesmo, na minha matutice, na minha timidez infantil, era o carnaval de Buíque, principalmente a saída do Zé Pereira, no sábado pré-carnavalesco. Naquela época, só tinha mesmo os três dias de carnaval, não é como hoje, que querem carnaval o ano inteiro, como se a vida fosse uma eterna festa. Do carnaval, lembro bem dos lança-perfumes  e, principalmente, de um certo folião que no clube de Buíque, que era o mercado público, me deu uma esborrifada do seu lança-pefume em meu olho direito, que fiquei completamente cego. Meu pai que estava comigo, ficou fulo da vida com o indivíduo, que tinha uns dentes de ouro na boca, conhecido como João da Cruz, mas com o tempo passou e fiquei por ali a olhar às difusoras, que eram os equipamentos de som das orquestras. Ficava olhando a emissão do som por àquelas cornetas e imaginava com os meus botões, que ali dentro devia ter um padre para cantar. Porque padre, numa festa de carnaval, eu não sei, só não entendia como era que aquele apetrecho estranho podia emitir o som da voz humana. Para mim era coisa nova, um mistério.
            Atualmente, ainda gosto de festas, não com a intensidade dos tempos passados, mas que festas sempre fazem parte da vida da gente e o bom seria que a nossa vida fosse sempre uma eterna festa, para que pudéssemos nos esquecer dos infortúnios, das desavenças, da miséria, da dor, do sofrimento e nos livrarmos dos nossos monstros interiores numa festa de rua qualquer.  

Nenhum comentário: