JUSTIÇA VISCERAL
A cada vez que o tempo vai
passando e que, vou chegando à casa das duas décadas e meia na labuta diuturna
como operador do Direito, que venho me decepcionando cada vez mais com à
Justiça. Não com essa instituição olhada do ponto de vista de sua estruturação
em tese, mas sim, de sua verdadeira aplicabilidade na prática, que a cada dia
que passa, vem se tornando cada vez mais drástica e piorada para os fins
colimados nos seus precípuos objetivos de boa aplicabilidade do Direito, sem
que venha a mostrar as suas vísceras de funcionamento, ou porque algo não está
funcionando como realmente o previsto, ou pela elaboração de leis ineficazes,
ineficientes quanto às suas aplicabilidades na prática, ou mesmo pela falta de
aplicadores da lei e, quando presentes, a pomposidade do cargo que em muitos
casos sobe à cabeça de uma grande parte, a ponto de se sentirem Deuses do
Olimpo e se acharem que são de verdade esses Deuses, aí não há como funcionar
como deveria ser, a nossa Justiça. O pior, só para nos ater à Justiça
pernambucana, é o fato de que, o Estado se encontra com um déficit de cerca de
200 vagas juízes a serem preenchidas, se bem que, existem em torno de 400
juízes em exercício, alguns certamente, em desvio de função, servindo de
assessores de alguns desembargadores ou em alguma função correlata importante
ou não, daí haver essa grande ausência da Justiça em grande parte de nossos 187
municípios pernambucanos. Foram nomeados 72 juízes no último de 30 de setembro,
mas não resolve a questão da falta de aplicadores da lei e por isso mesmo, a
nossa Justiça é àquela que se pode dizer visceral, que funciona com suas
vísceras expostas sem resolver a maioria dos problemas dos jurisdicionados que
só tendem mesmo a aumentar.
Um dos problemas que venho discutindo à exaustão há muito
tempo em minha vida de profissional do Direito, é justamente à questão crucial
da criação dos Juizados Especiais de Pequenas Causas. No bojo do cerne de sua
criação de produção legislativa, certamente imaginou o legislador, na
celeridade que adviria daí, com a criação de uma espécie de Juizado Especial,
voltado exclusivamente para uma solução rápida e eficiente nas áreas Cível e Criminal,
só que, com o decorrer do tempo de sua criação pela Lei nº 9099, de 26 de
setembro de 1995, na esfera da Justiça Comum, a eficientização da aplicabilidade
e celeridade da Justiça, não avançou, muito pelo contrário, com a acumulação de
demandas, tanto nas áreas cíveis quanto nas criminais, a coisa desandou a tal
ponto, que se transformou numa bola de neve que rolando pela montanha, está
fora do controle da burocracia de nosso Judiciário e, busco justamente me deter
argumentativamente, é na área criminal dos chamados processos simplificados,
que abrangem condutas típicas e antijurídicas delituosas, do que se achou por
bem chamar de menor potencial ofensivo, vindo daí, a criação dos chamados TCO’s,
que na verdade no meu ponto de vista, esse modelo não poderia sequer vir a ser
chamado de processo, isso porque não atende ao que constitucionalmente o
constituinte inseriu no texto constitucional, da infirmação contextual, de que “ninguém
poderá ser processado sem o devido processo legal”, o que inocorre no
caso dos chamados TCO’s, que diante de tanta fragilidade em sua estruturação,
desde à fase policial até chegar às mãos da Justiça, para que venha a ser
designada audiência para proposta do Ministério Público, na chamada transação
penal, que na verdade, deveria ser chamada de imposição penal, o autor do fato,
na maioria dos casos ou em todos eles, se veem numa arapuca, obrigados não a
transacionar, mas simplesmente aceitar uma proposta impositiva da instituição
ministerial sob pena de ser processado e, praticamente coagido, se vê nessa
condição na obrigação de aceitar uma condição sine qua non, para não se
ver processado, aceitando impositivamente uma condição substitutiva, que em
muitos casos, muitos fazem das tripas coração para poder cumprir a chamada
transação penal, expondo aí uma espécie de Justiça visceral em sua
aplicabilidade transversa, sem o devido processo legal. Melhor seria o
legislador repensar essa questão de TCO, que tanto trabalho vem dando tanto
para o Judiciário, quanto para o operador do Direito, principalmente pelo
número estafante de audiências que geralmente são designadas para um só dia,
sem que, o próprio Juiz de Direito de uma Comarca Única, a exemplo da de
Buíque, tenha condições de realiza-las, se valendo em muitos casos, de próprios
serventuários da Justiça, que com uma proposta de transação já previamente
elaborada, faz com que o autor do fato do chamado menor potencial ofensivo,
tenha que obrigatoriamente engolir, porque a chamada transação só tem uma mão
só e pronto, não existem argumentos para que se venha a cumprir dessa ou
daquela forma, quando em audiências presididas com serventuários que nada tem a
ver com juízes togados.
Ontem mesmo na Comarca de Buíque, aconteceu um fato
inusitado, talvez nem tanto, porque outros já ocorreram anteriormente, em que
foram designadas mais de 90 audiências e que, por alguma razão, apesar das
partes envolvidas terem comparecido, as audiências não acontecerem e foram
redesignadas para data ulterior, nos mesmos horários e num mesmo dia. Ora minha
gente, dessa forma é humanamente impossível se trabalhar e se ter uma Justiça
eficiente com as vísceras expostas que vem mostrando, em que todo o interior do
prédio do fórum ficou superlotado, além de pessoas nas áreas de fora em volta e
nas proximidades do próprio prédio. O pior é a questão do jurisdicionado, em
que a maioria reside em regiões distantes, tanto de Buíque, quanto de
Tupanatinga, para se deslocar e chegar no horário determinado e se frustrar
pela não efetivação, que por alguma razão não foram realizadas as audiências e,
depois de ter que percorrer todo esse mesmo calvário para num novo dia
posterior vir a comparecer novamente para mais uma longa espera ou de pés ou
sentado numa cadeira qualquer, suando com o calor estafante, muitos até sem
sequer ter tomado o café da manhã ou sem ter dinheiro para fazer sequer um
lanche. É esse sem retoques, o retrato visceral de nossa Justiça. Há de se
levar em consideração ainda, que nosso município tem uma área geográfica de
1.372 km2 e Tupanatinga, em torno de pouco mais de 900 km2. Quer dizer, em
áreas tão grandes, existem pessoas em nosso município, só a título de exemplo,
que para vir à cidade, tem que se deslocar em torno de 80 km, sem contar com a
irregularidade de transporte disponível para o deslocamento dessas pessoas.
Então há muito que o legislador pensar para acabar de vez com esse esdrúxulo
modelo de sei lá o que, apelidado de TCO, devendo ficar casos de somenos
importância a ser resolvidos nas próprias delegacias de política, sem
sobrecarregar e usar de uma Justiça visceral que além de já se encontrar
abarrotada e sem funcionar noutras espécies de questões importantes para
atender à demanda jurisdicional de quem precisa se acudir da Justiça, ver de
fato os seu problemas resolvidos de uma vez por todas, com a maior celeridade e
eficiência possível, por parte de nossas autoridades constituídas. O que está
havendo com essa Justiça Visceral que temos, é uma verdadeira falta de respeito
a quem desta precisa, esta é a verdade nua e crua, se do contrário for
demonstrado, estou aberto à discussões.
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