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sábado, 25 de julho de 2015

TÁBUA DE PIRULITO, QUEBRA-QUEIXO E O PICOLÉ DE ANTIGAMENTE



      Esses fatos que vou narrar nessa história de vida, posso adiantar, como se fora um conto particular de minha infância, mais parecido com uma das poesias dos recitais do nosso grande poeta, Jessiê Quirino, “Paisagem do Interior”. Era um tempo que o único gelado que tinha e isso quando a gente do Sítio Cigano, vinha para à feira de Buíque, nos dias de sábado, era o famoso “picolé”, que na verdade era acondicionado num objeto arredondado ou em forma de cubo, feito de alumínio, com uma tampa quadrada ou redonda na parte superior e conservado na base de pedras de gelo. Achava tudo aquilo muito interessante, e passava a indagar a mim mesmo, de como era feito tudo aquilo, o picolé saboroso, o gelo e como fazer para tudo assim de repente, não se derreter, se desmanchar em água de uma  hora para outra.
     Naqueles tempos também, o que mais se via era menino de um lado e de outro, com uma tábua de pirulitos, sustentada por um cabo de madeira, encostada em dos lados do ombro, ou com uma guarnição de madeira, retangular, cheia de quebra-queixo. Uns de um lado, outros de outro, gritavam quase em uníssono, fazendo a sua propaganda: Olha o quebra-queixo, olha o pirulito! E isso repetidamente para chamar a atenção de seus fregueses e venderem os seus produtos. Era uma delícia chupar àquele pirulito feito tão-somente na base de mel de açúcar e água, até ao ponto de se tornar o pirulito, que era colocado numa pequena lasca de madeira, uma espécie de palito, coberto com um papel de embrulho, que em muitos vezes, por se encontrar tão grudado, quase não saia por completo, mesmo assim, a gente deglutia com resto de papel e tudo. Já o quebra-queixo, também era feito na base do mel do açúcar, mas tinha o ingrediente coco, que ficava uma delícia, mas que comer quebra-queixo era literalmente, de quebrar o queixo, disso não me resta a menor dúvida. Era umas das minhas principais ansiedades de sair do Sítio Cigano para vir à feira dos sábados, para saborear um picolé, isso quando este vinha de Rio Branco para nossa cidade, ou então chupar um pirulito e comer uma talhada de quebra-queixo enrolado também, num papel de embrulho.
  Acredito que, quem não viveu esse período, do picolé acondicionado numas espécies de toneis ou cubo quadrado de alumínio, não muito grandes; dos pirulitos carregados numas tábuas pelos moleques de rua e dos famosos quebra-queixos, passou pela vida e não viveu o purismo do que era na verdade tudo aquilo e para quem era do sítio como eu, matuto ferrenho, tudo àquilo para mim, era novidade. Meu pai, como era cobrador de feira, tendo se aposentado até sua morte, como servidor público municipal de Buíque, isso porque meu avô, Mané Modesto, tinha grande influência política junto aos coronéis da época e arrumou esse emprego público com os políticos daqueles idos, porque concurso público, não existia ainda não e quem arrumava alguma besteira, por que quem não fosse mascateiro, vivesse da agricultura ou tivesse uma bodega ou uma loja para vender tecidos, outra atividade não existia em Buíque, a não para os jovens, aprenderem os ofícios de sapateiros ou de pedreiros, porque outra atividade não existia ainda não. Minha mãe e meu pai, criavam umas vaquinhas para tirar leite, para consumo de nós mesmos e nunca deixaram de plantar um roçado de milho e feijão, isso quando o ano era bom, quando não, nem isso existia. Lembro que muitas vezes, nossa mistura no almoço de somente feijão e farinha, era caju, quando de sua época e, no jantar, quantas não foram às vezes que minha mãe fazia beiju ou tapioca para o jantar e isso nos deixava satisfeitos para enfrentar um outro dia que se avizinhava dia após dia naquelas brenhas, porque de casa, praticamente, só tinha a nossa mesma, a não ser de outros vizinhos, mas sempre distantes umas das outras. Era um isolamento só.
    Uma das coisas que me deixou marcado também, foi o de fumo de corda, que meu pai, quando vinha para à feira de sábado, não poderia deixar de levar para minha mãe fazer os seus cigarros com um papel branco bem fininho que comprava também na feira e, quando não existia o papel, se valia mesmo, da palha de espiga de milho seca, que ela prepara justamente para fazer o cigarro de fumo de corda, que meu pai comprava um bom pedaço para durar à semana inteira. Outro ingrediente importante era o querosene jacaré, que também não poderia faltar, para colocar nos candeeiros, para iluminar as escuras noites de nossa rústica casebre. Dormir, como nada tinha para se fazer e, principalmente nas noites de escuro, depois de ouvir algumas histórias de trancoso contadas pela minha mãe, a gente ia dormir numa rede, ter pesadelos com duendes, para no outro dia, recomeçar tudo de novo. Às vezes ficava a brincar no denso solo recoberto por um areial finíssimo, isso quando não tinha que ir juntamente com minha mãe, para o cabo da enxada, limpar o mato na roça. No mais, naquele triste mundo desconhecido, era brincar dentro do imaginário infantil com o que a nossa rudimentar mentalidade pudesse vir a imaginar dentro de nossa simplicidade de vida e até cheguei mesmo a acreditar, que por àquelas brenhas, se iria chegar um veículo, quando as galinhas criassem dentes, era o que minha mãe dizia.
    Foi esse o meu mundo infantil, pelo menos uma partícula, porque a gente que nasce e cresce num ambiente desses, tem muita coisa na vida para contar, porque moldado na dureza da vida, desta tirou lições que irão com a gente até o último suspirar de nossas vidas e eu, jamais esquecerei de minha modesta e rude vida de pobre, desmazelado, um qualquer desconhecido, mas com muito amor por parte de meus pais, porém às vezes rudes, mesmo assim souberam nos dar, o que muitos que foram bem criados, não tiveram, que foi o bom caráter moral, o qual sem eles, certamente não teríamos de jeito nenhum e isso, vale também para meus irmãos. Meu pai, em algumas circunstâncias, pode até ter exagerado, mas nem por isso, deixou de ser um grande pai e, de minha mãe, sempre voltado com mais afinco e dedicação, assim como uma loba protetora, para com os nossos cuidados, sempre foi divina e grande mulher e isso, ela nunca abriu mão e era carrancuda e não guardava o que queria e tinha para dizer. Sempre foi dura e direta quando buscava falar a verdade para os embusteiros que também existem naquela época. Minha mãe era durona e não alisava a mão de gente sem-vergonha e cabra safado. Não fosse ela, acredito que sequer teríamos nos alfabetizado, não que meu pai não se preocupasse, mas minha mãe foi quem colocou os pés pelas mãos, para que a família passasse a morar na cidade, para que pudéssemos estudar, aprender as primeiras letras e isso foi feito, acredito lá por volta de final da década de cinquenta, quando então passamos a morar num casebre em frente à cadeia pública de Buíque, onde hoje é a Escola Carrossel. Mas nesse período o que me marcou mesmo, entre tantos outros momentos e fatos importantes em minha vida de criança, sem esquecer dos famosos picolés de Rio Branco, foram os deliciosos pirulitos e os famosos quebra-queixos, que não abria mão de prová-los quando nos dias de feira em Buíque. Velhos, singelos, rudimentares tempos que não voltarão jamais, mas que, até o último abrir e fechar de olhos, sempre estarão povoando o interior de minha mente.

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