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BUÍQUE, NORDESTE/PERNAMBUCO, Brazil
A VERDADE SEMPRE FOI UMA CONSTANTE EM MINHA VIDA.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A DOR DA DISCRIMINAÇÃO DENTRO DA PRÓPRIA ALMA

AS DIFICULDADES - Diante das adversidades da vida, fatores alheias à vontade das pessoas, mas que muita gente enfrenta, eu e minha família, em plena eferverscência da implantação da "ditadura militar", rumamos para o Estado de São Paulo, em início de 1964. Lembro com os meus tenros doze anos de idade, do triste dia da partida e do meu vira-latas "Japonês" a balançar o rabo, como que dando um adeus na hora da partida. Viajamos por cerca de quatro a cindo dias, num velho ônibus da Princesa do Agreste, até chegarmos à Estação do Braz. De lá, onde nos esperava o meu irmão mais velho, Miltinho, rumamos para a nossa nova morada, em Ribeirão Pires, cidade ainda pertencente à Região Metropolitana do Estado. Foi um deus-nos-acuda ter que enfrentar toda àquela sorte de dificuldades, de adaptação, coisa que nunca aconteceu e viver naquele mundo diferente e hostil. Sei que viver naquele lugar foi um aprendizado de vida, mas muito difícil de se aguentar. Foi como uma tortura numa prisão à céu aberto, porque ninguém se sentia bem e a saudade do Nordeste era tanta, nos apertava o coração e chorávamos por dentro de saudades da terra amada. Não pode falar de dor, quem na pela dor alguma sentiu.

ESTUDOS - Já alfabetizado pela metade em Buíque, em Ribeirão Pires, tive que ser matriculado numa escola de alfabetização ou primária, não sei bem, que tinha o nome de Dom José Gaspar. Era aluno aplicado, recolhido no meu cantinho, mesmo assim, aqui, acolá, motivo de chacotas e gozações por parte dos demais colegas, por ser nordestino. Geralmente era comum ser provocado pelos demais. Tinha medo de viver naquele mundo longínquo, estranho e hostil, mesmo assim, tinha que aguentar tudo aquilo, afinal de contas, era mais um nordestino numa terra alienígena de muita gente metida a besta. Lá já moravam outros conterrâneos, a exemplo do irmão da mulher do meu Tio Zé Modesto, Madrinha Auta, Luis Pinto e, de certa forma, nos facilitava à vida. Primeiramente, moramos numa casa velha, caindo aos pedaços e junto com bichos peçonhentos e uma ratazana que ficava noite a dentro a circular por dentro de casa. Depois, passamos a morar num pequeno barraco, próximo à casa de Luis Pinto. Ribeirão Pires, em São Paulo, foi uma cidade marcante na minha vida. Gostava de cinema e lá existiam na época, logo dois. Lembro que um dos fatos que sempre me fazem recordar, é o de que, certa feita, ao ir assistir um filme acompanhado do meu irmão "caçula", Milvernes, se não me engano o filme era "Ben Hur" e, ao ir ao banheiro, abri a torneira e depois não sei por qual razão, não a consegui fechar e, a água jorrando sem parar, passou a tomar conta do banheiro e, como não tinha outro jeito, saí de fininho, eu e meu irmão e fomos embora. Em Ribeirão ficamos por pouco tempo, depois, partimos para a capital, São Paulo, onde fomos morar na Vila Ema, que era uma região periférica próxima da Vila Prudente e da Vila do Cambuci, mas não era uma região muito boa, mesmo assim, lá vivemos por cerca de mais de seis anos, numa casa de dois cômodos, para acomodar mais de meia dúzia de pessoas da família, mesmo assim, nos aguentamos até voltarmos, enfim, para o nosso querido torrão. Mesmo morando numa casa com dois cômodos, a nossa hospitalidade era tanta, que quando chegava algum conterrâneo de Buíque e não tinha de início onde ficar, a gente ainda dava um jeito para a pessoa se acomodar. Questão de solidariedade com os nossos. Era assim a vida.

NA VILA EMA -  Meu irmão mais velho, trabalhava de pedreiro, meu pai, continuava a trabalhar em Cubatão, onde tinha que pegar um ônibus de um trem para se dirigir ao seu trabalho. Geralmente para chegar ao trabalho por volta das sete horas da manhã, tinha que se levantar às três da madrugada. Depois deixou de trabalhar naquele lugar e passou a trabalhar de servente de pedreiro, ele e Miro de seu Augusto, de quem era amigo, pai de Carlos Mãozinha, hoje advogado. Eu me iniciei também como ajudante de pedreiro, com pouco mais de quatorze anos de idade, juntamente com o meu irmão, Miltinho, Depois conseguir arrumar um emprego na Fábrica de Brinquedos Bandeirantes, como ajudante geral, após haver trabalhado numa gráfica, na Vila do Cambuci e numa fábrica de tampinhas de garrafa, na própria Vila Ema. Trabalhei também num supermercado de uma família de japoneses. Conhecíamos e convivíamos com muita gente do nordeste para matar as saudades e só se falava de um dia ainda voltar para a terra da gente, em face da vida humilhante que todos nós enfrentávamos naquele mundo distante e estranho. Era muita humilhação vivida por nós nordestinos. Nos impingiam gracejos e apelidos pejorativos de toda sorte. O tratamento dado a nós, nordestinos, era sempre de inferioridade, de chacotas e depreciativos, como se nada significássemos para eles, paulistas. Aguentávamos tudo aquilo, toda aquela humilhação, goela adentro, com muita tristeza e indignação, mas sempre com a idéia fixa de um dia voltamos à terra amada. O pior é que, tem muito nordestino naquele Estado, que por lá conviverem há longos anos, que até eles mesmos se  juntam aos paulistas para gozar dos seus pares, como se não fossem nordestinos também como nós.

NUNCA ME ENTREGUEI - Diante de tanta humilhação pelas quais passei, nunca capitulei, nunca me entreguei. Sempre sonhava, diante de tanta humilhação, em um dia ser alguém na vida, por isso mesmo, passei a estudar em escolas públicas e fazia questão de sempre ser o primeiro colocado das turmas aonde estudei nas escolas das Vilas Zelina e Vila Prudente, a ponto de todo mundo me paparicar nos dias das provas pedindo fila, coisa que eu procurava fazer questão de fazer ouvido de mercador para não passar fila para ninguém, afinal de contas, se quisessem aprender, que procurassem estudar, como eu fazia. Pior era que eu trabalhava de sete da manhã às seis da noite, com uma hora de almoço e ainda encontrava tempo para estudar. Pior era viver com toda família numa casa de somente dois cômodos e enfrentando toda dificuldade que se possa imaginar. Veja que situação de penúria em que já vivi em minha vida, mas superei, superamos, eu e minha família. Não que sejamos ricos e donos da verdade, mas vivemos momentos difíceis em nossas vidas e as superamos. Por isso mesmo, é que ninguém pode apontar o seu dedo para os outros sem ter conhecimento da história de ninguém. Se hoje posso aparentar ser alguma coisa ou até mesmo nada ser para alguém, é porque tenho uma história de vida e quem não tem história nada pode oferecer ao seu próximo.

ALEGRIA DA VOLTA - Após oito longos anos vividos naquela Selva de Pedra, eis que finalmente, em 1972, após haver sofrido um acidente em que perdi parte de um de meus dedos na fábrica aonde trabalhava, resolvi finalmente voltar para Buíque, uma vez que, Miltinho já houvera voltado e o restante da família também já se preparava para retornar daquele mundo infernal. Naquela época em São Paulo, já não se respirava um ar tão puro. Era uma poluição dos diabos saída dos bueiros de fábricas poluentes e voltar para Buíque, para sentir novamente o aspirar de um ar puro, de um sol escaldante e o cheiro de liberdade, não existiu maior glória em minha vida. Por isso mesmo é que posso dizer sem sombra de dúvidas, que saudade alguma me deixou esses oito anos que passei no Estado de São Paulo. Voltar lá, posse até voltar, mas só mesmo se for à negócio ou por uma questão de necessidade premente, mas para lá me fixar, só mesmo se for um castigo a essa altura de minha vida, afinal de contas, ninguém pode dizer, que dessa água não mais vai beber. De resto, São  Paulo foi um aprendizado de vida. Não acho que tudo foi perdido. O que não gostei foi a forma como somos lá discriminados e que apesar de todos esses anos, ainda somos vítimas desse preconceito e discriminação injustificáveis por parte de muitos desavisados que tem uma mentalidade nazi-fascista de ver a vida e que pouco sabem o que seja sofrimento e a dor de aguentar toda sorte de coisas na vida.

À TONA - Essa volta ao passado me veio à tona, à despeito dessa onda de dizeres e boataria pejorativos jogados na internet no momento, por conta da eleição de Dilma Rousseff, por uma estudante de Direito,  em que postou uma frase degenerativa, preconceituosa e racista contra a gente nordestina. Essa pessoa certamente é desprovida de todo e qualquer preparo para a vida, não aprendeu e nada sabe sobre o que é a vida e se sabe, deve responder pelos seus atos criminosos que cometeu, isto porque, os nordestinos não são lixo para serem tratados como se fôramos seres quaisquer, mas como  iguais, por imposição constitucional, ou ela não aprendeu isso como estudante ou estagiária de Direito ou seja lá o que for? - É bom que pessoas que assim pensam procurem fazer um tratamento numa clínica psiquiátrica especializada, afinal de contas, todo e qualquer ser humano merece ser respeitado. Tratamento discriminatório, racista, preconceituoso e depreciativo, por ser crime, deve ser punido, afinal de contas, ninguém é melhor ou pior do que quem quer que seja, afinal de contas, não estamos vivendo na época do III Reich, de 1940, em que Hitler quis dominar o mundo. A bandeira do nazi-fascismo que muitos teimam em levantar, deve de vez ser enterrada, ou essa estudante "porralouca" ainda não entendeu que vivemos numa democracia,  hem?

BUÍQUE DEU A MAIOR VOTAÇÃO PROPORCIONAL À DILMA - Em termos proporcionais, dos Municípios conhecidas da região, Buíque foi o que deu à Dilma a maior votação. Vejamos os percentuais dos votos válidos: Buíque - 92,45%; Arcoverde - 79,52%; Águas Belas - 69,03%; Alagoinha - 82,02%; Caetés - 83,50%; Pesqueira - 85 ,99%; Sanharó - 80,92%; Sertânia - 81,61%; Tupanatinga - 83,18%; Venturosa - 86,41%; Inajá - 91,04%; Itaíba - 80,06%; Ibimirim - 89,60% e Manari - 82,57%, só para ficar nessas mais conhecidas e próximas de Buíque. Nem mesmo a falta de transportes, impediu de os buiquenses comparecerem para votar em Dilma no segundo turno, tendo aproveitado os carros da romaria para Juazeiro do Norte, procuraram antes de viajar, para votar antes para depois rezar para meu "Padim Ciço".

A VISITA DE LULA -  A visita de Lula a Buíque, fato nunca ocorrido na história da república brasileira, foi de grande  importância para nossa terra. O fato é que, Lula ainda tem fortes ligações com Buíque, inclusive pessoas que ainda chegam a ser seus familiares. O que conta também é que Lula é extremamente popular e não deixa de falar com um, dar a mão a outro, um abraço ali mais na frente. Aqui mesmo em Buíque, por incrível que pareça, um cunhado meu, já falecido, que já houvera trabalhado no ABC paulista na época de Lula e por já ter sido noivo de uma de suas irmãs, ao chegar ao vê-lo no Sítio Serrinha onde fez uma visita, não se deixou envaidecer pelo cargo e de pronto, ao avistar o meu cunhado, não se fez de rogado e de pronto falou com ele normalmente e o tratando pelo apelido, isto depois de mais de vinte anos sem o ter mantido contato com ele. Quer dizer: Lula é o cara, ou não!

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