ALGUNS LEGEIROS FLASHS DE UM PASSADO DO FILME
DE MINHA VIDA
Minhas únicas imagens de quando era ainda uma criança chegando à adolescência. |
Não é em poesia que vou
escrever, mas sim, em prosa mesmo. Em vários escritos meus, sempre me reportei
sobre a minha via-crúcis de minha estada no Estado de São Paulo e do que foi
para mim e minha família, as dores do sofrimento enfrentadas naquela Selva de
Pedra, mesmo sendo nos idos dos anos sessenta para um pouco mais dos setenta, a
dureza enfrentada foi demasiadamente grande. Quando chegando naquele estranho
lugar, fomos morar em Ribeirão Pires, onde já residia de há muito tempo, o
irmão de minha Madrinha Alta, mãe de Blésman Modesto, naquela cidade paulistana.
Primeiramente, tivera ido meu irmão mais velho, Miltinho, para, pouco tempo depois
o restante da família, fazer o mesmo percurso tangidos que fomos para àquele
lugar, por circunstâncias alheias à nossa vontade, que não quero aqui no
momento esmiuçar, mas houve duas motivações principais, uma delas, foi
justamente uma tentativa de homicídio sofrida por meu pai, logo no iniociozinho
da década de sessenta, quando Blésman Modesto foi eleito prefeito de Buíque
pela primeira vez e uma outra, como de todo nordestino, de questão econômica,
diante das dificuldades e agruras enfrentadas quando das estiagens esporádicas
e da seca causticante, resolvemos enfim, viajar para o estado de São Paulo.
Logo no início, depois de ter saído de minha rústica escola de Buíque, que
ficava no centro da nossa cidade, ao chegar em Ribeirão Pires, fui estudar numa
escola municipal chamada de Dom José Gaspar, vizinha à Igreja Matriz daquela cidade,
que para mim, tudo era uma estranha novidade. Ainda criança lá por volta dos
meus tenros doze anos de idade, era o tipo de menino matuto, acanhando,
vergonhoso, recolhido à minha insignificância de nordestino, porque o que se
chama hoje de bullyng, naquela época também já existia e, para nós nordestinos,
tinha o agravante, de sermos discriminados pelo preconceito, sendo chamados de
baianos, cabeças chatas, o que nos entristecia e fazia-nos nos recolher a nossa
própria insignificância, embora com o peito estufado de revolta, esse “buliço”
só fazia com por dentro da gente crescesse e externasse nos estudos mais raça
do que os próprios paulistanos. Foi esse um primeiro release de minha vida
infantil, só para ficar somente nisso, lá numa terra para mim, diametralmente
diferente e estranha. Era como se tivesse ido para outro Planeta.
Chegamos em Ribeirão Pires, vindo de trem da Estação do Braz,
onde lá nos esperava, meu irmão Miltinho, todo paramentado de terno engravatado,
parecendo gente, certamente para mostrar que as coisas estavam dando certo em
sua vida e, pegamos o trem para ir ao nosso destino, que era a terra onde
morava Luis Pinto, seus familiares, que por sinal era uma grande família, sua
esposa dona Argentina e, perto deles, pouco tempo depois, nos arrumaram um
barraco, que foi a nossa segunda morada naquela cidade da região metropolitana
do Estado de São Paulo. Meu irmão trabalhava de pedreiro, meu pai arrumou um
emprego de serviços gerais em Taboão da Serra, cidade que fica depois de Ribeirão,
indo para a estrada de Santos. Só guardo na lembrança, o choque que passei,
junto com minha família, num mundo distante do da gente, de modos e costumes
diferentes e por tabela, além de todos esses desencontros, veio por tabela o
preconceito, que na verdade, nunca deixou de existir e ainda permanece com toda
força nos dias atuais, é só ver o que está acontecendo com o ódio implantado
nas eleições presidenciais em que os nordestinos praticamente votaram em massa
na candidata presidencial Dilma Roussef, aonde houve postagem em redes sociais
da internet, incitamento à violência, a ponto de alguém recomendar que o
Nordeste brasileiro, merecia mesmo era ser jogada uma bomba atômica do tipo
daquelas que arrasaram Hiroshima e Nagasaki, para durante setenta anos não viesse
a nascer nenhum nordestino, como se fôramos puro lixo desprezível. Isso minha
gente, só pode partir de pessoas imbecis, idiotas, sem visão de mundo, e que
não tem a menor noção do que vem a ser pessoas e o sentimento através do qual
devemos nos irmanar como brasileiros, porque como um república federativa,
nosso país é indivisível, mesmo que alguns estejam insatisfeitos, mas se o
Brasil não tivesse o Nordeste, acredito que seria bem diferente e não seria
este País do tamanho que ele é hoje, porque foi o nosso povo quem a força
motriz que levantou literalmente esta Nação, quer no trabalho pesado, ao mundo
das ciências, das letras e das artes, esta é a verdade, engula ou não, quem bem
quiser.
Depois de certo tempo, por fatores circunstanciais da vida,
passamos, eu e meus familiares, a morar na própria capital, São Paulo, na Vila
Ema, onde vim a trabalhar de servente de pedreiro, de peão de fábrica e,
durante à noite, estudava o curso ginasial numa Escola Estadual da Vila Zelina,
próxima da Vila Prudente. Nessa escola, de periferia, existiam os bons e os
maus alunos. Eu me dava com todos, mas fazia questão de me incluir entre os
melhores, por isso mesmo, era o primeiro aluno da minha classe e fiz muitas
amizades, certamente, porque nos dias das provas, grande parte dos colegas,
ficava voltado para mim, para passar alguma fila e assim, quando o professor se
descuidava, dava fila a um e a outro. Nessa escola, por ser o primeiro de minha
turma, fiz muitas amizades, das quais nem lembro mais, só depois de muitos
anos, através das redes sociais, foi que vim a encontrar um deles, que nunca
esqueci, pelo nome pitoresco que tem, João Segcs Filho, de origem turca, se não
me engano. Com esse colega também, estudei no Colégio João XXIII, na Vila
Prudente, onde fiz o curso de admissão ao ginásio, que ainda existia naquele
tempo. Existiam muitos outros, mas não me vem o nome à memória no momento, mas
as suas fisionomias tenho guardas em minha mente. Naquela época, ainda imperava
a ditadura militar e nas proximidades da escola onde estudava, numa certa
ocasião, só ouvi o estalar repetitivo de tiros de metralhadora e no outro dia
soube, que se tratava da morte de um dos que pegaram em armas contra à ditadura
e que se tratava do guerrilheiro Sargento Carlos Maringhella, que deixou o
exército brasileiro, para lutar contra o que muitos brasileiros se fizeram e
partiram para à luta armada, a exemplo de nossa presidente Dilma Roussef. Na
ocasião, vendo as coisas de perto, diante dos excessos impostos pela ditadura
militar, também tive um imenso impulso de também em armas pegar, mas só fiquei
mesmo no pensar. Mas uma das coisas que mais me emocionaram mesmo, foi quando numa
certa ocasião, fui comunicar ao diretor da Escola Estadual da Vila Zelina,
Professor José Nórcia Filho, homem extremamente dócil e educado, já falecido,
que ia volta para o Nordeste, para minha terra, Buíque e, se sentindo meio
desalentado, porque eu era um bom aluno, um dos primeiro da escola, tentou me
dissuadir da ideia, mesmo assim, lhe disse que era uma decisão definitiva e não
deu em outra, ele marcou para certo dia, sem que eu soubesse, e veio a reunir
todos os professores e alunos, e me fez uma surpresa, para a minha despedida,
me deu uma carta de recomendação elogiosa, que até hoje a tenho comigo e, me
senti tão emocionado com aquele humano e belo gesto, que pela primeira vez na
vida, criei coragem, tremeliquei, balbuciei trêmulas palavras e discursei pela
primeira vez em público. Pois é minha gente, isso se ratam apenas pequenas
fagulhas de minha vida, que com certeza, carregarei ao sono eterno, mas que
nesta ocasião, achei por bem relatar um pouco de desse passado, parte de meu
caminhar e sei que ainda, tenho muito para dar, para fazer em favor de nossa
gente e de nosso povo, por isso mesmo, quero mais servir do que propriamente
vir a ser servido.
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