GENTE DE BUÍQUE – A CEGA SANFONEIRA
FAGA
Sanfoneira de oito
baixos das melhores, apesar de cega, a velha “Faga”, como era conhecida, vez
por outra, fazia os forrós juninos da zona rural de Buíque, levantar a poeira e
pegar fogo até o sol raiá. Criança ainda, com certa frequência, costumava
passar pela sua rústica casinha, localizada na ponta da Rua Amélia Cavalcanti,
em Buíque, isolada, onde àquela época existia uma rala capoeira que se
prolongava até à rodagem de piçarra. Gostava de vê-la pegar aquele pequenino
fole velho de oito baixos, puxá-lo com as duas mãos como se fosse rasga-lo,
dedilhando velozmente as suas teclas e dele extrair notas musicais dos mais
famosos baiões do velho Lua, como Asa Branca, Assum Preto.... – Ficara horas a fita-la,
admirando aquela pessoa cega manejar tão bem seu pequenino instrumento musical.
Todo buiquense, de um modo geral,
gostava da velha Faga. Cega inteligente, sanfoneira habilidosa como poucas.
Entretanto, pouca coisa ou nada se fez por Faga, a não ser, quando moleques
mal-educados, mexiam com ela, lhes faltavam com o devido respeito e ela,
possuída de ira, dizia impropérios à molecada. Nunca admirei, na minha tenra
idade, atos de vandalismo e desrespeito para com uma pessoa humana,
principalmente, quando essa pessoa era indefesa e cega. Certa feita, acredito que
por volta de 1966, Luiz Gonzaga veio fazer um show aqui em Buíque e o levaram
até o pequenino casebre de Faga, para que ele a conhecesse. Chegando lá, a
ouviu tocar e muito gostou do modo como a velha Faga interpretou suas músicas
no velho fole de oito baixos. Acho que nenhum forrozeiro de Buíque, ou que por
lá tenha passado, jamais esqueceu os tempos bons dos forrós dos mato, das
pontas de ruas, tocados pela velha Faga e seu companheiro fiel, o velho fole de
oito baixos.
Hoje nem mais lembranças existem da
velha sanfoneira cega, falecida há mais de quinze anos. Nem sequer menção
alguma é feita, talvez quem sabe, pela sua condição de quase miserabilidade em
que vivia e por seus oito baixos, ter ficados restritos nos limites de Buíque.
A memória, a história de um município e suas mais polêmicas personagens,
independentemente da origem e condição social, que de certa forma tenham
contribuído para o engrandecimento cultural, promovendo a alegria do povo,
devem vez por outra ser relembrados, no sentido de avivar a memória dos mais
velhos e prover de conhecimentos os mais novos sobre seus antepassados. A
finalidade de que fatos passados venham à tona é de suma importância, sobretudo
quando vem proporcionar à juventude maiores esclarecimentos e direcionando-a
para uma formação mais crítica sobre os fatos geradores das comunidades
interioranas.
NOTA:
Este artigo escrevi quando morei em Pesqueira e foi publicado pela primeira
vez, no Jornal Nova Era, mantido pela Diocese da Igreja Católica, e que, em
1988, cheguei a incluí-lo entre tantos outros, no meu primeiro livro, MODESTO À
PARTE, página 92. Foi uma homenagem que achei por bem fazer a velha sanfoneira
cega, FAGA, que só os mais antigos ainda devem lembrar dela, mas que os mais
jovens, de nada tem conhecimento sobre essa exímia sanfoneira de oito baixos
buiquense, que fez parte de minha infância aqui em Buíque. Isso só prova, que
minha preocupação com a cultura de nossa terra e de nossa gente, não vem de
hoje, mas sempre foi uma constante em minha vida.
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